por
Ademário Costa*
O que me motiva a escrever novamente é a reação das pessoas, que se sentiram ofendidas com o título do texto
“Só podiam ser brancos e ricos”, atribuindo a ele um conteúdo racista.
Este tipo de reação é fruto da forma em que se estrutura o racismo na sociedade brasileira.
No
Brasil a cor da pele e os traços físicos constituem componentes
determinantes do posicionamento econômico e social dos indivíduos.
A
naturalidade com que se associa a condição de ser branco com o sucesso
profissional, melhor renda e localização social, exime esta parte da
população de se envergonhar de sua condição de maioria ideológica,
social, política e econômica — mesmo sendo minoria populacional.
Do
outro lado da moeda os negros são maioria em todas as situações de
vulnerabilidade social, nas prisões, nas favelas, na exposição ao crime,
entre os que estão fora da escola; mesmo nos estados do Sul, em que
somos minoria populacional, estamos super representados entre os mais
pobres.
Apesar da naturalização desta situação ela só foi possível
graças à política oficial de favorecimento da população branca através
de políticas de Estado. Isto se chama racismo institucional.
Através da Bula “Dum Diversas” o Papa Nicolau, autoriza o rei de Portugal colocar indígenas e africanos no trabalho escravo.
Poder
este que foi estendido em 1554 ao rei da Espanha; um decreto lei
complementar à Constituição de 1824, proibiu a comunidade negra de
frequentar a escola, qualquer escola; a lei de terras (1850/ nº601)
determinou que as terras só poderiam ser obtidas através de compra.
Enquanto
isso, o Exército foi encarregado de combater os quilombos e os
imigrantes europeus receberam terras, dinheiros e sementes.
A
guerra do Paraguai foi usada para exterminar um milhão de negros; a Lei
do Ventre Livre determinou que as crianças nascidas de pais escravizados
fossem separadas de suas famílias, surgindo a primeira legião de
menores abandonados; a Lei dos Sexagenários desobrigou os senhores de
cuidarem dos trabalhadores escravizados ao ficarem velhos e doentes.
Em
28 de junho de 1890, um decreto lei reabriu a política de imigração,
direcionada à população europeia e impediu a entrada de africanos e
asiáticos.
O objetivo foi utilizar a mão de obra branca e europeia
para ocupar os principais postos de trabalho na nascente indústria
paulista, impedindo que a população negra ocupasse estes postos e se
tornasse uma poderosa classe média.
Pobres brancos foram utilizados para marginalizar os negros.
Estas
leis são parte da construção histórica que naturalizou a atribuição de
características negativas à comunidade negra, e nos fizeram achar normal
o posicionamento de brancos nos melhores espaços.
Assim, o texto
anterior rompe com o pacto de silêncio sobre o tema, fazendo um setor da
sociedade experimentar uma caracterização com a qual não estão
acostumados.
Desprovidos do poder no Brasil, não podemos ser
acusados de racistas quando identificamos que o preenchimento das “áreas
vips” através de critérios negociais, de proximidade social e de
classe, culmina com uma hiper representação da população branca em todos
os espaços de poder, bem distante do que realmente representam no
conjunto populacional do país.
Mas se apesar disso tudo você acha
que sua condição social, econômica ou política se deu única e
exclusivamente pelos seus méritos pessoais, não apoia as políticas de
reparação ou acha que elas são apenas favores do Estado; se foi contra o
PROUNI, cotas raciais para ingresso nas universidades e no serviço
público, Bolsa Família, Mais Médicos, elevação do salário mínimo,
direitos das domésticas; se não está disposto a abrir mão de seus
privilégios e reconhecer as vantagens comparativas inerentes à sua cor
de pele, então não tem jeito, gire sua bússola, ou vai continuar sendo
racista.
*Ademário Sousa Costa é Cientista Social
Fonte:
Viomundo