quinta-feira, 26 de julho de 2012

"BROTHER MORREU"


Quarta-feira, 25 de julho de 2012 07:11 pm

crônica da cidade

Blog da Conceição - CB
Brother morreu

Brother era meu brother sem que fôssemos amigos. Nossas conversas ficaram geograficamente delimitadas pelo Pacotão dos anos 1980. Cruzamos nossas felicidades nos melhores carnavais de minha vida. Não sei nada sobre a vida do Brother, onde nasceu, se foi casado, se teve filhos, onde trabalhava mais recentemente, onde morava. Naquele tempo não havia Facebook — esse desfile compulsivo de intimidades.

Mesmo sem ter convivido com o Brother, ele exercia sobre mim o efeito de um anjo. O sorriso eterno transmitia confiança e afeto. Brother parecia não ter obscuridades nem amarguras. E se as tivesse, não deixava que a escuridão contagiasse o sorriso. Brother não procurava, não esperava, não se afligia, não contestava… Brother brotheava.

Os muitos amigos que com ele conviveram e que estiverem lendo essa crônica podem dizer que não era nada disso. Perdoem-me, mas não importa. Brother passou desse modo pela minha avenida. Quando eu via o Brother num ambiente público, eu me dizia, calidamente: estou perto de antigamente. Era um menino-Brother transbordante. E a bebida talvez fizesse dele o Brother que ele era.

A morte do Brother chegou em má-hora — como se houvesse boa hora para morrer. A implacável senhora anda rondando a minha geografia afetiva. E de modo penoso: ela tem chegado vagarosa e mansamente. Como se quisesse que eu a conhecesse mais de perto, de um modo quase palpável.

Não tenho nada contra a morte. Acho-a bela, acreditem, acredite. Morrer é se reincorporar ao universo e, portanto, ao que conhecemos como eternidade. Morrer é voltar ao absoluto, é se reintegrar à natureza. É existir de outro modo, sem a consciência a que os humanos foram agraciados e condenados. Morrer é voltar a ser poeira cósmica. Esse é meu modo de dar sentido à morte.

A morte existe nos vivos. Somos nós, os perduradores, que sentimos a facada inclemente da terrível senhora. Somos nós quem morremos em vida quando morre um de nossos queridos. A morte de um amado reduz a amplitude de nosso viver. Quem quererá viver sozinho no deserto tenebroso da Terra? A morte vai nos matando na morte dos nossos amores.

A paisagem urbana de Brasília morreu um pouco ontem. Perdeu em doçura, em alegria, perdeu cor e perdeu malemolência. Brother é um personagem da cidade. Como o indefectível, inenarrável e insuperável Charles Preto, ele, e os demais membros da Sociedade Armorial Patafísica Rusticana, trouxeram bom-humor, malícia, inteligência e atrevimento à capital de concreto armado. Brother ajudou a dar graça e vida ao Plano Piloto dos anos de chumbo. Sorte dos anjos — vai ter samba no céu.

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