segunda-feira, 27 de setembro de 2010

A Moderna Alquimia dos Cabelos

MATÉRIA DE CAPA » A ciência a favor do cabelo De olho em consumidoras cada vez mais ávidas por novidades, a indústria cosmética investe pesado em pesquisas para amenizar o excesso de química e, ao mesmo tempo, deixar os fios belos e sedosos

Publicação: 23/09/2010 19:17 Atualização: 24/09/2010 20:31

Pílulas que prometem, em pouco tempo, fios mais saudáveis; tintura sem amônia; escovas progressivas que usam proteínas, aminoácidos, queratina, polímeros e tantos outros componentes difíceis de pronunciar… Há muito, a dupla xampu e condicionador deixou de ser o único item de primeira necessidade nas madeixas da mulher moderna. Diante do bombardeio de tanta química nos fios, a indústria cosmética tem se debruçado cada vez mais em pesquisas para criar produtos que, ao mesmo tempo que amenizem os efeitos colaterais de tantos elementos artificiais, deixem os fios sedosos e brilhantes. Um desafio que resulta em investimentos bilionários e na descoberta de tecnologias inovadoras, impossíveis de se conceber em um tempo nem tão remoto assim. Afinal, quem poderia imaginar que a amônia seria abolida da coloração ou que fios naturalmente ondulados permaneceriam lisos durante meses sem o obrigatório uso de amônia? A Revista ouviu cabeleireiros, tricologistas, dermatologistas e empresas do ramo para descobrir o que há de mais novo no mercado quando o assunto é cabelo — e, de preferência, lindo e saudável.

Tintura sem amônia

Neulza experimentou a tintura sem amônia e aprovou: sem queimação e com maior durabilidade - (Valério Ayres/Esp. CB/D.A.Press)
Neulza experimentou a tintura sem amônia e aprovou: sem queimação e com maior durabilidade

A partir do próximo mês, chega aos principais salões de beleza do Brasil um produto que tem feito sucesso na Europa e nos Estados Unidos e promete revolucionar a indústria cosmética local: a tintura sem amônia. A novidade surge quase um século depois da criação da primeira coloração capilar permanente e, para muitos cabeleireiros, representa uma grande mudança na coloração capilar. “Quando o tonalizante, que também não tem amônia em sua composição, foi lançado, já achei uma revolução, apesar de ele não cobrir os fios brancos por completo e sair rapidamente com as lavagens. Mas a tintura sem amônia é, simplesmente, espetacular”, derrete-se o colorista brasiliense Hugo Nakanishi.
Entre as principais vantagens do Inoa, como a L’Oréal batizou o novo produto, está o fato de ela não ter o cheiro forte das tinturas convencionais, de não provocar irritações no couro cabeludo e, principalmente, de agredir muito menos os fios. Na coloração comum, a amônia tem a função de quebrar a cutícula do cabelo para que a coloração penetre no córtex capilar e ali permaneça por um determinado período de tempo. No novo produto, um sistema único, rico em óleo — o Oil Delivery System (ODS) —, empurra o pigmento para dentro do fio sem causar essa ruptura da cutícula. “É uma tintura bem menos agressiva. Na verdade, ela até ajuda a tratar o cabelo, pois, por ser um agente oleoso, protege o fio”, garante Hugo, um dos primeiros coloristas do Brasil a ser treinado com o Inoa e que já começou a experimentá-lo nas clientes que têm maior sensibilidade às tintas.
É o caso de Neulza Romero Lima, 72 anos. Adepta aos fios coloridos há mais de 40 anos, nos últimos meses, a artista plástica vinha apresentando rejeição à tintura. “A cabeça esquentava. O meu dermatologista falou que o couro cabeludo ficou saturado.” Ao experimentar o novo produto, disse não ter sentido qualquer ardor ou incômodo. Neulza conta que há alguns anos usou, em Paris, uma tintura sem amônia, mas nunca tinha encontrado nada similar no Brasil. Outra vantagem apontada por Neulza foi a durabilidade da coloração. Segundo ela, os fios estavam demorando mais a embranquecer.
De acordo com o fabricante, a Inoa clareia os cabelos em até três tons e garante 100% da cobertura dos fios brancos. O tempo de aplicação é o mesmo da tintura convencional — 35 minutos. O produto é para uso exclusivamente profissional e os coloristas precisam passar por um treinamento antes de começar a usá-lo nas clientes. Isso porque a aplicação é muito precisa. Diferentemente da tintura comum, em que são misturados dois componentes — a pigmentação misturada à amônia e o oxidante —, no Inoa são três elementos: o óleo gel (ODS), a pigmentação concentrada e o oxidante. Por isso, em um primeiro momento, poucos salões estarão aptos a trabalhar com a tintura sem amônia, que custa, em média, 20% a mais. “Principalmente para a mulher brasiliense, que apresenta bastante escamação do couro cabeludo no período da seca, esse produto é maravilhoso”, atesta a colorista brasiliense Tânia de Souza.

Um pouco de história
A arte de tingir a cabeleira começou há mais de 3 mil anos, com os egípcios, que usavam inúmeros corantes extraídos de animais e vegetais. Mas foi só no início do século passado que a tintura de cabelo surgiu de forma como conhecemos hoje. Em 1909, Eugène Schuller, recém-graduado da Faculdade de Engenharia Química da França, cria um produto inovador, batizado de Oréal, à base de elementos químicos, principalmente a parafenilenediamina. Até então, as tentativas de criar tinturas em larga escala eram à base de henna e sais minerais, que agrediam os fios. Schuller funda, então, a Société Française des Teintures Inoffensives pour Cheveux, que, em 1933, viria a se chamar L’Oréal.

Pílulas diárias de beleza
Já imaginou tomar diariamente uma pílula e ficar com o cabelo lindo, sedoso e brilhante? É isso que promete a Innéov que, recentemente, lançou um nutriconcentrado de beleza que, por conta dos nutrientes presentes em sua fórmula, garante combater a queda capilar, reforçar a microcirculação e limitar os efeitos dos radicais livres na raiz dos fios. A novidade vem em fórmula de cápsulas, que devem ser ingeridas diariamente. De acordo com a diretora de marketing da empresa, Roberta Rocha, os resultados tornam-se visíveis a partir do terceiro mês de uso. “Os nutricosméticos traduzem uma tendência mundial em se cuidar da beleza de dentro para fora. Em vez de usar a conhecida via tópica, como os cremes e géis, são cápsulas para uso oral que trazem benefícios para o embelezamento”, explica a farmacêutica Leandra Sá de Lima. Ela alerta, porém, que antes de sair por aí comprando as pílulas, é preciso consultar um profissional de saúde.
“É preciso saber a quantidade de componentes presentes na composição, já que uma dose elevada de nutrientes também pode intoxicar”, observa a nutricionista Denise Samari Silva Pelles. Ela alerta que outra coisa a ser observada é se a flora intestinal está absorvendo direito o produto. “Se não estiver, é preciso associar as pílulas a outros medicamentos que complementem a deficiência. O médico precisa analisar se a dosagem está exagerada, ver quais as necessidades em relação ao nutriente para chegar à ideal. É interessante que se faça um exame para descobrir isso.”
O dermatologista Luiz Carlos Cuce, professor emérito da Universidade de São Paulo, não acredita, porém, nos efeitos desse tipo de pílula. “O colágeno é digerido pelo intestino e não chega à pele”, justifica. “Ainda não vi nenhum caso de um paciente que tenha feito uso das pílulas e tenha sido bem sucedido.”

Louca por novidades

Marcelle reconhece o mal que o excesso de química faz ao cabelo: hidratação e investimento em produtos de qualidade - (Rafael Ohana CB/D.A.Press)
Marcelle reconhece o mal que o excesso de química faz ao cabelo: hidratação e investimento em produtos de qualidade

Marcelle Franco Amaral é adepta das novidades nos salões de beleza há 12 anos. Não há como precisar ao certo quantos procedimentos foram, mas a bancária de 28 anos conta que já testou vários tratamentos em busca de um cabelo mais macio e sedoso. Atualmente, retocar as mechas louras e garantir que os fios estejam sempre brilhantes com diferentes tipos de hidratação estão no topo da lista de prioridades na cadeira dos salões. “O cabelo fica bem mais elegante.”
Mas deixar as mechas e os fios no lugar tem seu preço — literalmente. A cada visita ao salão — geralmente, de dois em dois meses —, Marcelle desembolsa em torno de R$ 300. “Sempre que venho retocar as mechas aproveito para hidratar o cabelo, secar e cortar. Tudo isso vai agregando valor.” E é justamente no momento da hidratação que surgem as novidades irresistíveis. “Quando o cabeleireiro diz que tem um produto novo, faço na hora. Nem me lembro o nome do último”, admite.
Hoje, ela conta que a escova progressiva não faz mais parte do pacote. Apesar de diminuir consideravelmente o volume dos cabelos, a longo prazo os produtos químicos presentes na fórmula acabaram por deixar os fios com uma aparência pouco desejável, com pontas duplas e ressecados. Para resolver o problema, só mesmo com muita hidratação — especialmente em casa. “Agora, cuido dele com leave in e algumas máscaras que deixo no cabelo depois de lavar. Quando você toma a decisão de fazer tintura ou química, tem que investir em marcas boas e ter disciplina”, ensina.

Os fios, assim como a pele, envelhecem
O tempo vai passando e ele já não é mais o mesmo. A cor mudou, a textura também. As escovadas, antes vigorosas, agora precisam ser feitas com mais cuidado, já que os fios estão quebradiços e frágeis. Até o jeito de ser está diferente: agora, o cabelo parece mais ondulado. As pontas estão ressecadas. Geralmente, associado ao aparecimento dos temidos cabelos brancos, o envelhecimento capilar não é só uma consequência do passar dos anos. Ele vem para todos, e pode até chegar antes da hora. Tudo depende de como você trata suas madeixas e de como leva a vida.
Além das mudanças na cor, na textura e na resistência, o tricologista Ademir Júnior frisa que há outros indicativos de que o cabelo está ficando velho: a perda do brilho, da maciez, da elasticidade e da hidratação dos fios. Como em todo o restante do organismo, a saúde dos fios está diretamente relacionada aos cuidados que se tem com o corpo no dia a dia. “Calor em excesso (secador e chapinha), água muito quente no banho, químicas de transformação, piscina, mar, cigarro e poluição aceleram o envelhecimento capilar”, enumera o médico.
Mas como, exatamente, ocorre esse envelhecimento? Valcinir Bedin, presidente da Sociedade Brasileira para Estudos do Cabelo, explica que, como todas as células do corpo humano, as do cabelo também envelhecem. Após os 50 anos de idade, os fios tornam-se mais ralos e finos — já que a densidade deles diminui com o tempo. “Isso acontece porque existe a somatopausa, que é a parada de crescimento celular”, completa o também tricologista. Ter predisposição genética também é um dos fatores que influenciam no tempo do processo. Por isso, Bedin destaca que é possível uma pessoa jovem ter fios envelhecidos.
E, para as adeptas de procedimentos como tinturas, permanentes e alisamentos, um alento: segundo Valcinir Bedin, não há nada que se possa fazer, do ponto de vista externo, que piore o processo de envelhecimento capilar. Para manter os fios com uma aparência jovem e saudável, a recomendação do médico é investir em uma boa alimentação, hidratação interna constante e cuidados externos, como o uso de filtro solar e hidratantes. Por falar em hidratação, não economize nos banhos de creme: eles são importantes aliados para manter os fios bonitos e sempre brilhantes. “O ideal é que se faça uma hidratação dos fios uma vez por semana. Quando se sente com os dedos uma leve aspereza, já é hora de hidratar”, acrescenta Bedin.

Lisos, mas sem agressão
Chapinha, baby liss, escova de chocolate, de açúcar, marroquina, japonesa e mais uma infinidade de nomes e alternativas para um problema que parece perseguir todas as representantes do sexo feminino que já pisaram no planeta: a vontade de ter um cabelo diferente do que o que a natureza impôs. Antes de se entregar às novidades dos cabeleireiros, porém, é preciso se informar sobre a composição química dos produtos e da sua ação nos fios a longo prazo. Se você tem cabelos crespos ou cacheados e sonha em exibir uma cabeleira lisa, a professora da faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) Maria Valéria Velasco explica que o relaxamento e o alisamento são duas opções muito procuradas, mas que, no fundo, querem dizer a mesma coisa. “Quando o objetivo é só diminuir o volume, as pessoas dizem que é relaxamento.”
No alisamento, porém, o que muda é a quantidade de produto e o tempo de efeito no cabelo. Maria Valéria, que também dá palestras sobre alisantes e relaxantes capilares em cursos de especialização em tricologia, aconselha esperar no mínimo três meses entre uma aplicação e outra, para que os fios tenham tempo de crescer. “Os produtos são aplicados na parte nova do cabelo”, explica. Por isso, é necessário esperar que a raiz alcance de dois a três centímetros, uma vez que o produto não pode entrar em contato com o couro cabeludo. Ela explica que, como são feitos com hidróxido de sódio (também conhecido como soda cáustica), o contato dos produtos com a pele pode causar queimaduras.
Menos invasivas que alisamento e relaxamento, ela diz que as escovas que usam proteínas, aminoácidos, queratina e polímeros são as mais indicadas para quem procura apenas uma forma de deixar o cabelo ondulado mais liso. Contudo, para cabelos mais rebeldes, como os crespos e cacheados, a opção não tem tanta eficácia. “Essas escovas surgem como se fossem novidade, mas usam basicamente um só compenente químico, que é a amônia”, analisa Maria das Graças Santos, cabeleireira de um salão de beleza especializado em cabelo afro.
A diferença dos cabelos afro para os demais, segundo Maria das Graças, é a necessidade de constante oleosidade. A curvatura dos fios dificulta que o óleo natural dos cabelos percorra todo o cabelo. Por isso, é importante investir em cremes com componentes oleosos na fórmula, como lanolina e glicerina. “Métodos com amônia não são indicados para o cabelo crespo, porque aumenta o ressecamento”, completa a profissional. A hidratação para esse tipo de cabelo deve ser feita duas vezes por semana. E cuidado para não confundir cauterização ou selagem com hidratação: embora ajudem a dar um aspecto mais leve ao cabelo, os dois procedimentos não são para hidratar. “São métodos alisantes, pois misturam formol”, alerta. Para minimizar os danos, ela aconselha o uso de produtos com hidróxido.

Materia: REVISTA do CORREIO, do Jornal Correio Braziliense, de 26.09.2010


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